Art. 276 - Formas de comprovação da embriaguez ao volante, por Julyver Modesto de Araujo
No final de março de 2012, fomos surpreendidos pela notícia de que o Poder Judiciário teria invalidado a “Lei seca” (nome popular dado à Lei nº 11.705/08, que alterou o Código de Trânsito Brasileiro, com a finalidade de “estabelecer alcoolemia zero” e impor penalidades mais severas ao condutor que dirigir sob influência de álcool), o que, efetivamente, não ocorreu: a decisão do Superior Tribunal de Justiça apenas confirmou o entendimento que vinha se consolidando, após a mudança do CTB, de que o crime de trânsito, para que reste configurado, depende da verificação da quantidade de álcool no organismo do condutor, já que o artigo 306 do CTB pune aquele que dirigir com concentração de, no mínimo, 6 decigramas de álcool por litro de sangue.
O caso julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (cuja notícia oficial pode ser lida em http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=105218) manteve a decisão favorável dada pelo Tribunal de Justiça do DF, relativa a um condutor do Distrito Federal, que, com base apenas em exame clínico, respondia pelo crime de trânsito cometido pouco antes da entrada em vigor da Lei nº 11.705/08, e argumentou a retroatividade de lei penal mais benéfica (já que passou a exigir a dosagem alcoólica) – a decisão foi tão polêmica, que nem teve unanimidade de votos (5 a 4).
Meu objetivo, portanto, neste texto, é explicar detalhadamente sobre as formas de comprovação da “embriaguez ao volante”.
A primeira explanação a se fazer é quanto a um “falso direito”, contemplado pela seguinte previsão legal: “Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: ... direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada” - este é o exato teor do artigo 8º, item 2., letra g) da Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969, também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, da qual o Brasil é signatário e que foi estabelecida como base de proteção dos Direitos humanos.
Embora o seu objetivo tenha sido coibir os abusos e garantir as liberdades individuais, o direito de “não-incriminação” (Nemo tenetur se detegere) tem sido utilizado como escudo para se matar no trânsito. Sob o seu manto, tem-se entendido, Brasil afora, que o condutor não é obrigado a assoprar o etilômetro (vulgo “bafômetro”) ou permitir que se proceda à coleta de seu sangue, para verificar se ele bebeu antes de dirigir.
Se o filósofo grego Aristóteles (século IV a.C.) voltasse repentinamente e fosse instado a se manifestar sobre a problemática “álcool e direção”, creio que o seu silogismo nos seria apresentado, de maneira bem resumida, da seguinte forma:
1. A bebida alcoólica reduz os reflexos e diminui a capacidade de discernimento do homem.
2. Para dirigir um veículo automotor, são necessários reflexos e discernimento apurados.
3. Logo, quem bebe, não pode dirigir.
Simples assim!
Apesar de ser um raciocínio para o qual não existem contra-argumentos, os ébrios do volante consideram que o seu “direito de não se incriminar” supera o direito à vida das pessoas que cruzarem seu caminho, enquanto as suas capacidades estiverem reduzidas.
É importante sempre destacar a precariedade de um documento de habilitação: a pessoa deve cumprir determinados requisitos, entre eles o de ser penalmente imputável (artigo 140 do Código de Trânsito Brasileiro); deve comprovar aptidão física, mental e psicológica (artigo 147 do CTB); ser capacitado em Curso Teórico-técnico, de 45 horas/aulas, e em Curso de Prática de Direção veicular, de 20 horas/aulas, com 20% das aulas em horário noturno (Resolução do CONTRAN nº 168/04); ser aprovado em dois Exames, um escrito e outro prático; para só aí receber uma Permissão para Dirigir, documento provisório, válido por apenas um ano, período em que ele não pode cometer nenhuma infração de trânsito de natureza grave ou gravíssima ou ser reincidente em infrações médias (artigo 148, § 3º, do CTB); e, de posse do documento concedido pelo Estado, comprovar, a cada 5 anos, que continua com aptidão física e mental para dirigir veículos; além disso, deve demonstrar, o tempo todo, domínio do seu veículo e obediência às normas de trânsito, sob pena de ser responsabilizado penal, civil e administrativamente pelas condutas irregulares em que for surpreendido pela fiscalização de trânsito... e, apesar de todo este aparato estatal, o condutor considera que não pode sofrer reprimendas quando não for possível determinar que ele se encontra sob influência de álcool... trata-se, evidentemente, de um despropósito sem tamanho!
Divagações à parte, analisemos a legislação de trânsito, como hoje se encontra: quem dirige veículo automotor, sob influência de álcool, pode se enquadrar em duas condutas distintas:
1º. Infração de trânsito do artigo 165 do CTB, com multa de R$ 957,70, suspensão administrativa do direito de dirigir por doze meses e retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado – a partir de qualquer quantidade de álcool (embora a redação do artigo não estabeleça um limite mínimo, há que se observar a tolerância, adiante explanada, quando realizada a medição do sangue ou do ar);
2º. Crime de trânsito do artigo 306 do CTB, com detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão do direito de dirigir ou proibição de se obter a habilitação, que pode ser aplicada pelo juiz, de dois meses a cinco anos – a partir de seis decigramas de álcool por litro de sangue.
Apesar de a Lei nº 11.705/08 (conhecida como “Lei seca”) ter sido publicada justamente com o objetivo de estabelecer alcoolemia zero para a condução de veículo, não é esta hoje a regra; isto porque o parágrafo único do artigo 276 do CTB prevê a possibilidade de criação de margens de tolerância para casos específicos, o que foi estabelecido pelo Governo federal, por meio do Decreto nº 6.488/08, para todos os casos: dois decigramas de álcool por litro de sangue (podemos dizer que a “Lei seca” é, no máximo, “Lei úmida” e a alcoolemia zero é, na verdade, alcoolemia dois).
E quanto valem “dois decigramas de álcool por litro de sangue”? A resposta é “depende”.... Esqueçam qualquer tabela de equivalência, entre quantidade de bebida ingerida e massa corporal, pois há uma variação de diversos fatores, como tempo transcorrido desde a ingestão e o exame; tipo de bebida; alimentação da pessoa que bebeu e, principalmente, o quanto se está acostumado a beber; por este motivo, o mais prudente é a alcoolemia zero, para não se criar falsas expectativas; a tolerância não é uma permissão para que se beba até aquele limite, mas uma margem de segurança para a fiscalização de trânsito...
A partir destas considerações, analisemos o artigo 277 do CTB, quanto às formas de comprovação da “embriaguez ao volante”:
O caso julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (cuja notícia oficial pode ser lida em http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=105218) manteve a decisão favorável dada pelo Tribunal de Justiça do DF, relativa a um condutor do Distrito Federal, que, com base apenas em exame clínico, respondia pelo crime de trânsito cometido pouco antes da entrada em vigor da Lei nº 11.705/08, e argumentou a retroatividade de lei penal mais benéfica (já que passou a exigir a dosagem alcoólica) – a decisão foi tão polêmica, que nem teve unanimidade de votos (5 a 4).
Meu objetivo, portanto, neste texto, é explicar detalhadamente sobre as formas de comprovação da “embriaguez ao volante”.
A primeira explanação a se fazer é quanto a um “falso direito”, contemplado pela seguinte previsão legal: “Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: ... direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada” - este é o exato teor do artigo 8º, item 2., letra g) da Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969, também conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, da qual o Brasil é signatário e que foi estabelecida como base de proteção dos Direitos humanos.
Embora o seu objetivo tenha sido coibir os abusos e garantir as liberdades individuais, o direito de “não-incriminação” (Nemo tenetur se detegere) tem sido utilizado como escudo para se matar no trânsito. Sob o seu manto, tem-se entendido, Brasil afora, que o condutor não é obrigado a assoprar o etilômetro (vulgo “bafômetro”) ou permitir que se proceda à coleta de seu sangue, para verificar se ele bebeu antes de dirigir.
Se o filósofo grego Aristóteles (século IV a.C.) voltasse repentinamente e fosse instado a se manifestar sobre a problemática “álcool e direção”, creio que o seu silogismo nos seria apresentado, de maneira bem resumida, da seguinte forma:
1. A bebida alcoólica reduz os reflexos e diminui a capacidade de discernimento do homem.
2. Para dirigir um veículo automotor, são necessários reflexos e discernimento apurados.
3. Logo, quem bebe, não pode dirigir.
Simples assim!
Apesar de ser um raciocínio para o qual não existem contra-argumentos, os ébrios do volante consideram que o seu “direito de não se incriminar” supera o direito à vida das pessoas que cruzarem seu caminho, enquanto as suas capacidades estiverem reduzidas.
É importante sempre destacar a precariedade de um documento de habilitação: a pessoa deve cumprir determinados requisitos, entre eles o de ser penalmente imputável (artigo 140 do Código de Trânsito Brasileiro); deve comprovar aptidão física, mental e psicológica (artigo 147 do CTB); ser capacitado em Curso Teórico-técnico, de 45 horas/aulas, e em Curso de Prática de Direção veicular, de 20 horas/aulas, com 20% das aulas em horário noturno (Resolução do CONTRAN nº 168/04); ser aprovado em dois Exames, um escrito e outro prático; para só aí receber uma Permissão para Dirigir, documento provisório, válido por apenas um ano, período em que ele não pode cometer nenhuma infração de trânsito de natureza grave ou gravíssima ou ser reincidente em infrações médias (artigo 148, § 3º, do CTB); e, de posse do documento concedido pelo Estado, comprovar, a cada 5 anos, que continua com aptidão física e mental para dirigir veículos; além disso, deve demonstrar, o tempo todo, domínio do seu veículo e obediência às normas de trânsito, sob pena de ser responsabilizado penal, civil e administrativamente pelas condutas irregulares em que for surpreendido pela fiscalização de trânsito... e, apesar de todo este aparato estatal, o condutor considera que não pode sofrer reprimendas quando não for possível determinar que ele se encontra sob influência de álcool... trata-se, evidentemente, de um despropósito sem tamanho!
Divagações à parte, analisemos a legislação de trânsito, como hoje se encontra: quem dirige veículo automotor, sob influência de álcool, pode se enquadrar em duas condutas distintas:
1º. Infração de trânsito do artigo 165 do CTB, com multa de R$ 957,70, suspensão administrativa do direito de dirigir por doze meses e retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado – a partir de qualquer quantidade de álcool (embora a redação do artigo não estabeleça um limite mínimo, há que se observar a tolerância, adiante explanada, quando realizada a medição do sangue ou do ar);
2º. Crime de trânsito do artigo 306 do CTB, com detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão do direito de dirigir ou proibição de se obter a habilitação, que pode ser aplicada pelo juiz, de dois meses a cinco anos – a partir de seis decigramas de álcool por litro de sangue.
Apesar de a Lei nº 11.705/08 (conhecida como “Lei seca”) ter sido publicada justamente com o objetivo de estabelecer alcoolemia zero para a condução de veículo, não é esta hoje a regra; isto porque o parágrafo único do artigo 276 do CTB prevê a possibilidade de criação de margens de tolerância para casos específicos, o que foi estabelecido pelo Governo federal, por meio do Decreto nº 6.488/08, para todos os casos: dois decigramas de álcool por litro de sangue (podemos dizer que a “Lei seca” é, no máximo, “Lei úmida” e a alcoolemia zero é, na verdade, alcoolemia dois).
E quanto valem “dois decigramas de álcool por litro de sangue”? A resposta é “depende”.... Esqueçam qualquer tabela de equivalência, entre quantidade de bebida ingerida e massa corporal, pois há uma variação de diversos fatores, como tempo transcorrido desde a ingestão e o exame; tipo de bebida; alimentação da pessoa que bebeu e, principalmente, o quanto se está acostumado a beber; por este motivo, o mais prudente é a alcoolemia zero, para não se criar falsas expectativas; a tolerância não é uma permissão para que se beba até aquele limite, mas uma margem de segurança para a fiscalização de trânsito...
A partir destas considerações, analisemos o artigo 277 do CTB, quanto às formas de comprovação da “embriaguez ao volante”:
Art. 277 - Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob influência de álcool, será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia, ou outro exame que por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado.
§ 1º. Medida correspondente aplica-se no caso de suspeita de uso de substância entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos.
§ 2º. A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.
§ 3º. Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.
§ 1º. Medida correspondente aplica-se no caso de suspeita de uso de substância entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos.
§ 2º. A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.
§ 3º. Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.
Os exames mencionados no artigo 277 estão detalhados na Resolução do CONTRAN nº 206/06 (apesar de a Lei nº 11.705/08 ter sido publicada depois, esta é a única norma do CONTRAN existente até o momento, e que, por não ser conflitante com a atual redação do CTB, tem sido considerada válida) e podem ser assim resumidos:
- exame de sangue;
- teste de ar alveolar (por meio do “etilômetro”);
- exame clínico;
- constatação objetiva (denominação didática que utilizo).
Tenho defendido que é obrigatória a realização de, pelo menos, um destes exames, priorizando os dois primeiros, que são mais completos; não sendo correta a imposição de multa por mera recusa, como tem ocorrido em vários Estados brasileiros, nos quais os órgãos de trânsito entendem que o § 3º do artigo 277 teria criado uma segunda penalidade: a multa pela não submissão aos exames – minha contrariedade a este procedimento decorre das seguintes premissas:
I – o § 3º deve ser entendido em consonância com o que estabelece o caput do artigo (princípio de hermenêutica jurídica) e, portanto, a recusa somente é relevante se o condutor estiver sob suspeita. A simples condução de um veículo automotor, pelo local de fiscalização, não é uma suspeita de que o condutor se encontra sob influência de álcool, sendo necessário que ele apresente alguns sinais que induzam a esta conclusão (e, neste caso, o § 2º seria suficiente para a imposição da penalidade pela infração de trânsito cometida);
II – o princípio da reserva legal (artigo 5º, inciso XXXIX da Constituição Federal) e o princípio da taxatividade (próprio do Direito penal, aplicável, por analogia, ao Direito administrativo sancionador) impedem que alguém seja punido por uma conduta que não esteja expressamente prevista como ilícita – ora, o que existe é a infração do artigo 165 do CTB, “Dirigir sob a influência de álcool”, e não a infração por “Não se submeter ao procedimento para comprovar a influência de álcool”.
Das formas descritas no artigo 277, duas são as principais, para verificação da concentração do álcool no organismo de uma pessoa: a mais adequada, por meio da análise do sangue, e a indireta, por medição do ar presente nos alvéolos pulmonares – esta, graças à Lei de Henry, descoberta pelo químico britânico William Henry, em 1801: A solubilidade de um gás dissolvido em um líquido é proporcional à pressão parcial do gás acima do líquido - em outras palavras: o ar que se encontra mais próximo da corrente sanguínea possui uma concentração proporcional daquilo que está no próprio sangue; para se fazer o cálculo desta proporção, adota-se o índice de partição 2000 – multiplicando-o pelo índice constatado no ar, obtém-se o valor da concentração no sangue; assim é que a tolerância de dois decigramas de álcool por litro de sangue equivale a 0,1 mg de álcool por litro de ar, pois 0,1 mg x 2000 = 200 mg = 20 cg = 2 dg.
O etilômetro, portanto, precisa medir o ar mais profundo do organismo da pessoa, a fim de permitir este cálculo proporcional, motivo pelo qual os agentes fiscalizadores devem ter o cuidado de perguntar, em caso de ingestão de bebida alcoólica pelo condutor fiscalizado, há quanto tempo isto ocorreu, pois uma medição apressada pode acarretar detecção do ar presente na mucosa bucal, o que pode ocorrer, inclusive, se tiver resquícios de álcool proveniente de antisséptico ou de bombom de licor, como se comenta por aí... é possível, sim, que tais produtos acarretem um “falso positivo”, se o álcool ainda estiver na boca, dúvida que pode ser facilmente dirimida se o teste for realizado da maneira correta, dando o tempo devido para a sua realização e permitindo-se que o averiguado faça um bochecho com água.
De igual sorte, os etilômetros passivos que têm sido utilizados por alguns órgãos de fiscalização têm o condão apenas de auxiliar na seleção dos condutores que serão fiscalizados, verificando-se aqueles que se encontram sob suspeita de terem consumido bebida alcoólica; seu resultado é decorrente do ar próximo da boca e vias aéreas do condutor, podendo sofrer influências, inclusive, do meio externo. Assim, o seu resultado inicial deve ser referendado pelo teste adequado, com a utilização do bocal e o assopro do condutor, para análise do ar proveniente dos pulmões.
Por ser um equipamento metrológico, o etilômetro ainda está sujeito a alterações; apesar de passar por inspeção anual, são admitidos erros máximos em sua medição, os quais devem ser descontados, para consideração do valor real, o que é determinado pela Portaria INMETRO nº 006/02, na seguinte conformidade:
- para medições inferiores a 0,4 mg – devem ser descontados 0,032 mg;
- para medições entre 0,4 e 2,0 mg – deve ser descontado 8%;
- para medições superiores a 2,0 mg – deve ser descontado 30%.
Por exemplo, se um condutor apresentar o resultado medido de 0,13 mg de álcool, por litro de ar alveolar, estará isento de qualquer responsabilidade, tendo em vista que 0,13 – 0,032 = 0,098 (portanto, abaixo da tolerância legal de 0,1 mg).
Assim, teremos as seguintes situações, frente à medição de álcool no condutor:
Forma de comprovação | Tolerância Infração | Infração + Crime |
Exame de sangue | até 2,0 dg / l | 2,01 a 5,99 dg / l 6 dg / l em diante |
Teste de ar (valor medido) | até 0,13 mg / l | 0,14 a 0,33 mg / l 0,34 mg / l em diante |
Uma questão interessante é a respeito do crime do artigo 306 do CTB, que assim está redigido: Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência – por prever, taxativamente, a quantidade de álcool por litro de sangue, alguns entendem que o teste de ar alveolar não seria suficiente para sua caracterização, o que é um ledo engano, já que o próprio parágrafo único deste dispositivo estabelece que O Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo e, neste sentido, destaca-se o Decreto federal nº 6.488/08, em seu artigo 2º, que determina a seguinte equivalência:
6,0 dg de álcool por litro de sangue = 0,3 mg de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões.
Como se viu, esta equivalência não foi uma decisão aleatória, mas decorrente da proporcional química estabelecida pela Lei de Henry, outrora mencionada, com a proporção de 1/2000: 0,3 mg x 2000 = 600 mg = 60 cg = 6 dg.
Isto significa que tanto o exame de sangue, quanto o teste de ar, são suficientes para caracterizarem a influência de álcool, seja para a configuração da infração de trânsito, ou do crime.
Em ambas as formas de comprovação até aqui delineadas, todavia, há a necessidade de uma participação ativa do condutor fiscalizado, que deve permitir que se retire o seu sangue ou deve assoprar o etilômetro. É aqui que se encontra o “x” da questão: entendo que o problema de “não criar prova contra si mesmo” tem uma condicionante maior do que a necessidade de respeito aos direitos individuais – como exigir que alguém, de livre e espontânea vontade, contribua com algo que vai lhe causar uma punição, caso detectada a ingestão de bebida alcoólica?
É por este motivo, que existem outras duas formas de comprovação, que independem da vontade da pessoa: o exame clínico, realizado pelo médico da Polícia judiciária, e a constatação objetiva, realizada pelo agente de trânsito, mediante a verificação de sinais notórios da embriaguez.
São os seguintes os sinais notórios, previstos na Resolução do CONTRAN nº 206/06: I – Quanto à aparência: sonolência, olhos vermelhos, vômito, soluços, desordem nas vestes, odor de álcool no hálito; II – Quanto à atitude: agressividade, arrogância, exaltação, ironia, falante, dispersão; III – Quanto à orientação: sabe onde está?, sabe a data e a hora?; IV – Quanto à memória: sabe seu endereço?, lembra dos atos cometidos?; V – Quanto à capacidade motora e verbal: dificuldade no equilibro, fala alterada.
Assim, a não submissão espontânea do condutor, sob suspeita, à comprovação de sua condição, não invalida a aplicação das medidas concernentes à infração de trânsito, desde que o exame clínico ou a constatação objetiva tenham sido conclusivas, quanto à influência de álcool. Nestes casos, entendo que a realização do exame de sangue ou o teste de ar alveolar devem ser vistos não como uma ameaça ao direito do cidadão, mas como um direito que ele possui, de a eles se submeter e provar que os exames realizados sem equipamentos estão equivocados e que, efetivamente, não bebeu...
Contudo, os exames sem equipamentos não servem, hoje, para determinar que o crime foi cometido, já que a redação do artigo 306 estabelece um limite. A discussão atual tem girado em torno, justamente, desta necessidade de dosimetria para o crime, ou seja, o Superior Tribunal de Justiça apenas expôs o posicionamento de que, havendo um limite fixado na lei, somente é possível punir criminalmente se houver a devida comprovação desta quantidade; portanto, a decisão do STJ em nada muda a fiscalização de trânsito realizada pela Polícia Militar e demais agentes de trânsito, que continuarão adotando as medidas decorrentes da constatação da infração administrativa de trânsito e, eventualmente, conduzindo ao Distrito policial os condutores suspeitos de haverem cometido o crime de trânsito correspondente (independente se responderão por este).
Frise-se que a possibilidade de responsabilização criminal aos condutores que estão sob visível influência de álcool, sem a medição da quantidade em seu organismo, já vem sendo discutida no Congresso Nacional, desde que a polêmica se iniciou, com a vigência da Lei 11.705/08 – esta é, por exemplo, entre várias alterações do CTB, a proposta contida no Projeto de Lei nº 2872/08 (http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=384224), do Deputado Federal Carlos Zarattini, reforçada em outro mais recente Projeto, do Deputado Federal Hugo Leal, de nº 3559/12 (http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=539137), apresentado após a decisão do Superior Tribunal de Justiça, como medida adotada pelo Poder Legislativo, para corrigir a falha legal reconhecida pelo Judiciário.
A bem da verdade, estas não são as duas únicas proposituras para mudança do CTB, no que se refere à “embriaguez ao volante” - para se ter uma ideia, tramitam, no Congresso Nacional, quase 50 Projetos de lei, para se corrigir este problema e/ou aumentar o rigor da punição aos que dirigem embriagados (veja a tabela completa, ao final deste texto – são tantos Projetos, que minha pesquisa corre o risco de estar até incompleta). Isto sem contar na campanha “Não foi acidente” (http://naofoiacidente.org/blog/), que pretende encaminhar petição pública, propondo penas mais rigorosas aos condutores embriagados; em outras palavras, é tanta sugestão, de várias pessoas com boa intenção, que, sinceramente, não sei se teremos boas (e definitivas) soluções a curto prazo.
Encerro, aqui, minha contribuição para o estudo jurídico da questão, embora com certo sentimento de que perdemos mais tempo criando leis e discussões doutrinárias sobre qual é o comportamento adequado nas vias públicas, do que, realmente, estabelecendo soluções para garantir a segurança do trânsito. Seria tão mais simples se todos aceitassem a premissa “Se for dirigir, não beba” e se resignassem, passivamente, com as consequências pelas suas decisões equivocadas...
Isto significa que tanto o exame de sangue, quanto o teste de ar, são suficientes para caracterizarem a influência de álcool, seja para a configuração da infração de trânsito, ou do crime.
Em ambas as formas de comprovação até aqui delineadas, todavia, há a necessidade de uma participação ativa do condutor fiscalizado, que deve permitir que se retire o seu sangue ou deve assoprar o etilômetro. É aqui que se encontra o “x” da questão: entendo que o problema de “não criar prova contra si mesmo” tem uma condicionante maior do que a necessidade de respeito aos direitos individuais – como exigir que alguém, de livre e espontânea vontade, contribua com algo que vai lhe causar uma punição, caso detectada a ingestão de bebida alcoólica?
É por este motivo, que existem outras duas formas de comprovação, que independem da vontade da pessoa: o exame clínico, realizado pelo médico da Polícia judiciária, e a constatação objetiva, realizada pelo agente de trânsito, mediante a verificação de sinais notórios da embriaguez.
São os seguintes os sinais notórios, previstos na Resolução do CONTRAN nº 206/06: I – Quanto à aparência: sonolência, olhos vermelhos, vômito, soluços, desordem nas vestes, odor de álcool no hálito; II – Quanto à atitude: agressividade, arrogância, exaltação, ironia, falante, dispersão; III – Quanto à orientação: sabe onde está?, sabe a data e a hora?; IV – Quanto à memória: sabe seu endereço?, lembra dos atos cometidos?; V – Quanto à capacidade motora e verbal: dificuldade no equilibro, fala alterada.
Assim, a não submissão espontânea do condutor, sob suspeita, à comprovação de sua condição, não invalida a aplicação das medidas concernentes à infração de trânsito, desde que o exame clínico ou a constatação objetiva tenham sido conclusivas, quanto à influência de álcool. Nestes casos, entendo que a realização do exame de sangue ou o teste de ar alveolar devem ser vistos não como uma ameaça ao direito do cidadão, mas como um direito que ele possui, de a eles se submeter e provar que os exames realizados sem equipamentos estão equivocados e que, efetivamente, não bebeu...
Contudo, os exames sem equipamentos não servem, hoje, para determinar que o crime foi cometido, já que a redação do artigo 306 estabelece um limite. A discussão atual tem girado em torno, justamente, desta necessidade de dosimetria para o crime, ou seja, o Superior Tribunal de Justiça apenas expôs o posicionamento de que, havendo um limite fixado na lei, somente é possível punir criminalmente se houver a devida comprovação desta quantidade; portanto, a decisão do STJ em nada muda a fiscalização de trânsito realizada pela Polícia Militar e demais agentes de trânsito, que continuarão adotando as medidas decorrentes da constatação da infração administrativa de trânsito e, eventualmente, conduzindo ao Distrito policial os condutores suspeitos de haverem cometido o crime de trânsito correspondente (independente se responderão por este).
Frise-se que a possibilidade de responsabilização criminal aos condutores que estão sob visível influência de álcool, sem a medição da quantidade em seu organismo, já vem sendo discutida no Congresso Nacional, desde que a polêmica se iniciou, com a vigência da Lei 11.705/08 – esta é, por exemplo, entre várias alterações do CTB, a proposta contida no Projeto de Lei nº 2872/08 (http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=384224), do Deputado Federal Carlos Zarattini, reforçada em outro mais recente Projeto, do Deputado Federal Hugo Leal, de nº 3559/12 (http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=539137), apresentado após a decisão do Superior Tribunal de Justiça, como medida adotada pelo Poder Legislativo, para corrigir a falha legal reconhecida pelo Judiciário.
A bem da verdade, estas não são as duas únicas proposituras para mudança do CTB, no que se refere à “embriaguez ao volante” - para se ter uma ideia, tramitam, no Congresso Nacional, quase 50 Projetos de lei, para se corrigir este problema e/ou aumentar o rigor da punição aos que dirigem embriagados (veja a tabela completa, ao final deste texto – são tantos Projetos, que minha pesquisa corre o risco de estar até incompleta). Isto sem contar na campanha “Não foi acidente” (http://naofoiacidente.org/blog/), que pretende encaminhar petição pública, propondo penas mais rigorosas aos condutores embriagados; em outras palavras, é tanta sugestão, de várias pessoas com boa intenção, que, sinceramente, não sei se teremos boas (e definitivas) soluções a curto prazo.
Encerro, aqui, minha contribuição para o estudo jurídico da questão, embora com certo sentimento de que perdemos mais tempo criando leis e discussões doutrinárias sobre qual é o comportamento adequado nas vias públicas, do que, realmente, estabelecendo soluções para garantir a segurança do trânsito. Seria tão mais simples se todos aceitassem a premissa “Se for dirigir, não beba” e se resignassem, passivamente, com as consequências pelas suas decisões equivocadas...
São Paulo, 04 de abril de 2012.
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, MESTRE em Direito do Estado pela PUC/SP e ESPECIALISTA em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Capitão da Polícia Militar de SP, atual Chefe do Gabinete de Treinamento do Comando de Policiamento de Trânsito; Coordenador e Professor dos Cursos de Pós-graduação do CEAT (http://www.ceatt.com.br/); Conselheiro do CETRAN/SP, desde 2003 e representante dos CETRANS da região sudeste no Fórum Consultivo por dois mandatos consecutivos; Diretor do Conselho Consultivo da ABRAM e Presidente da Associação Brasileira de Profissionais do Trânsito – ABPTRAN (http://www.abptran.org/); Conselheiro fiscal da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET/SP, representante eleito pelos funcionários, no biênio 2009/2011; Autor de livros e artigos sobre trânsito, além do blog http://www.transitoumaimagem100palavras.blogspot.com/.