Art. 140 - Processo de habilitação para categoria “B”, por Julyver Modesto de Araujo
Desde que o atual Código de Trânsito Brasileiro entrou em vigor, em janeiro de 1998, o processo de formação de condutores passou a ter uma regulamentação mais complexa, procurando-se aprimorar, cada vez mais, o mecanismo direcionado à obtenção da Carteira Nacional de Habilitação, com diversas alterações ocorridas ao longo dos últimos anos, como a exigência de aulas noturnas (§ 2º do artigo 158 do CTB, pela Lei nº 12.217/10) e, mais recentemente, a obrigatoriedade de aulas em simuladores de direção veicular, que, até o final de 2013, deverão ser incluídas no processo de formação e ministradas após o início das aulas teóricas e antes mesmo da expedição da Licença para Aprendizagem de Direção Veicular – LADV, conforme a alteração da Resolução do Conselho Nacional de Trânsito nº 168/04, por meio da Resolução nº 444/13 (publicada no DOU de 25/06/13)
Embora o processo de primeira habilitação tenha, basicamente, a mesma regulamentação geral, tanto para a categoria “A” quanto para a “B” (ou para ambas), quanto às etapas necessárias e às exigências para o condutor, apresentaremos aqui as regras direcionadas para a obtenção da categoria “B”, como primeira habilitação (no caso de condutor já habilitado para veículos de duas ou três rodas, que queira tão somente adicionar esta categoria à sua CNH, basta a realização de Exame de Aptidão Física e Mental e o cumprimento da mesma carga horária mínima, do Curso de Prática de Direção Veicular, seguido do Exame realizado pelo órgão de trânsito).
Inicialmente, cabe esclarecer que a categoria “B” da CNH destina-se, conforme artigo 143, inciso II, do Código de Trânsito Brasileiro, ao condutor de veículo motorizado, não abrangido pela categoria “A”, cujo peso bruto total não exceda a três mil e quinhentos quilogramas e cuja lotação não exceda a oito lugares, excluído o do motorista (sendo exigência inicial para a obtenção das categorias de habilitação posteriores, de “C” a “E”).
Feita esta explicação inicial, passemos à análise do processo de habilitação, passo-a-passo:
Requisitos
Os requisitos para a abertura do processo de habilitação, de acordo com o artigo 140 do CTB e artigo 2º da Resolução do Contran nº 168/04 são apenas quatro: I – ser penalmente imputável; II – saber ler e escrever; III – possuir documento de identidade; e IV – possuir Cadastro de Pessoa Física – CPF. Cumpridas tais condições, o candidato deverá iniciar o processo no município de domicílio ou residência, ou na sede estadual do próprio órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal.
Etapas do processo de habilitação
Após o cadastramento do candidato no Registro Nacional de Condutores Habilitados – RENACH, serão realizadas as seguintes etapas, na ordem em que se apresentam: 1ª) Exame de Aptidão Física e Mental (e Avaliação Psicológica); 2ª) Curso Teórico-técnico; 3ª) Exame Teórico-técnico; 4ª) Curso de Prática de Direção Veicular; e 5ª) Exame de Prática de Direção Veicular.
Se o candidato requerer habilitação em “A” e “B”, simultaneamente, será submetido a um único Exame de Aptidão Física e Mental e Avaliação Psicológica, desde que considerado apto para ambas.
O processo do candidato à habilitação ficará ativo no órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, pelo prazo de 12 (doze) meses, contados da data do requerimento do candidato.
1ª ETAPA: Exame de Aptidão Física e Mental
O exame de Aptidão Física e Mental é preliminar e renovável a cada cinco anos (ou a cada três anos para condutores com mais de sessenta e cinco anos de idade), no local de residência ou domicílio do examinado, abrangendo os seguintes procedimentos médicos, nos termos da Resolução do Contran nº 425/12:
I – anamnese (questionário e interrogatório complementar);
II – exame físico geral (morfologia, comportamento e atitude, estado geral do organismo);
III – exames específicos (oftalmológica, otorrinolaringológica, cardiorrespiratória, neurológica e do aparelho locomotor);
IV – exames complementares ou especializados, solicitados a critério médico.
O exame de Aptidão Física e Mental inclui também a Avaliação Psicológica, por conta das alterações legislativas que ocorreram quando da aprovação do Código de Trânsito Brasileiro. Inicialmente, a Avaliação Psicológica era prevista como um exame apartado, no inciso II do artigo 147, o qual foi, todavia, vetado. Apesar disso, antes mesmo de o CTB entrar em vigor, nova alteração fez com que a exigência da Avaliação Psicológica fosse mantida, como integrante do exame de Aptidão Física e Mental, com a inserção do § 3º a este mesmo artigo, pela Lei 9.602/98.
O artigo 5º da Resolução nº 425/12 cuida de explicitar quais devem ser os processos psíquicos aferidos:
I – tomada de informação;
II – processamento de informação;
III – tomada de decisão;
IV – comportamento;
V – auto-avaliação do comportamento; e
VI – traços de personalidade.
Para tanto, devem ser utilizadas algumas técnicas e instrumentos, a saber: entrevistas diretas e individuais; testes psicológicos, de acordo com regulamentação específica do Conselho Federal de Psicologia; dinâmicas de grupo; e escutas e intervenções verbais.
Por fazer parte do Exame de Aptidão Física e Mental, a Avaliação Psicológica possui a mesma validade acima descrita.
Cabe ressaltar que, quando houver indícios de deficiência física, mental ou de progressividade de doença que possa diminuir a capacidade para conduzir veículo, o prazo de validade do Exame poderá ser diminuído a critério do perito examinador.
2ª ETAPA: Curso Teórico-técnico
O Curso Teórico-Técnico deve ser realizado em um Centro de Formação de Condutores especialmente credenciado para esta finalidade, nos termos e condições estabelecidos na Resolução do Contran nº 358/10.
Sua estrutura curricular básica, abordagem didático-pedagógica e disposições gerais do Curso estão previstos no Anexo II da Resolução do Contran nº 168/04, com as alterações da Resolução n. 285/08.
O Curso tem a carga horária total de 45 horas/aula (cada uma correspondente a 50 min), abrangendo as seguintes disciplinas:
1. Legislação de Trânsito: 18 (dezoito) horas/aula;
2. Direção defensiva para veículos de duas ou mais rodas: 16 (dezesseis) horas/aula;
3. Noções de Primeiros Socorros: 4 (quatro) horas/aula;
4. Noções de Proteção e Respeito ao Meio Ambiente e de Convívio Social no Trânsito: 4 (quatro) horas/aula;
5. Noções sobre Funcionamento do Veículo de duas ou mais rodas: 3 (três) horas/aula.
A nova sistemática de formação de condutores, que deve ser implantada até 31/12/13, prevê, ainda, a realização de aulas simuladas, conforme Resolução do Contran nº 444/13, segundo a qual “as aulas realizadas em simuladores de direção veicular serão de 5 (cinco) horas aulas de 30 (trinta) minutos cada, com intervalos de 30 (trinta) minutos, ministradas após inicio das aulas teóricas e, antes da expedição da Licença para Aprendizagem de Direção Veicular – LADV. As aulas serão realizadas nos Centros de Formação de Condutores das categorias “A, B ou A/B”, desde que cumpridos os requisitos de infraestrutura física previstos pelo Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN”.
3ª ETAPA: Exame Teórico-técnico
Após a conclusão do Curso de formação, o candidato à CNH deve realizar Exame Teórico-técnico, constituído de prova convencional ou eletrônica de no mínimo 30 (trinta) questões, incluindo todo o conteúdo programático, proporcional à carga horária de cada disciplina, organizado de forma individual, única e sigilosa, devendo obter aproveitamento de, no mínimo, 70% (setenta por cento) de acertos para aprovação.
A responsabilidade pela aplicação do exame é do órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, ou de entidade pública ou privada por ele credenciada.
No caso de reprovação no Exame Teórico-técnico, o candidato só poderá repetir o exame depois de decorridos 15 (quinze) dias da divulgação do resultado.
Após a aprovação no Exame Teórico-técnico, o candidato estará apto à realização da Prática de Direção Veicular, para o que receberá a Licença para Aprendizagem de Direção Veicular – LADV expedida pelo órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, e deverá estar, em todas as aulas, acompanhado por um Instrutor de Prática de Direção Veicular, sendo que, se for encontrado conduzindo em desacordo com esta regra, terá a LADV suspensa pelo prazo de seis meses.
4ª ETAPA: Curso de Prática de Direção Veicular
O Curso de Prática de Direção Veicular é realizado em um Centro de Formação de Condutores categoria “B” (a categoria aqui não tem qualquer relação com a categoria de CNH, tratando-se apenas da classificação destinada às instituições de ensino credenciadas para o ensino de prática de direção veicular, isto é as antigas “Auto-Escolas”).
Para obtenção da categoria “B”, as aulas devem ser realizadas em veículo motorizado de quatro rodas, excetuando-se o quadriciclo, com câmbio mecânico, com, no máximo, cinco anos de fabricação, identificado por uma faixa amarela de 20 (vinte) centímetros de largura, pintada na lateral ao longo da carroceria, a meia altura, com a inscrição “AUTO-ESCOLA” na cor preta, sendo que, nos veículos de cor amarela, a faixa deverá ser emoldurada por um filete de cor preta, de no mínimo 1 cm (um centímetro) de largura (as exigências quanto ao veículo de aprendizagem constam do artigo 8º da Resolução do Contran nº 358/10, que prescreve os requisitos para o credenciamento de Centros de Formação de Condutores).
Exige-se, durante o Curso prático, o mínimo de 20 (vinte) horas/aula na categoria pretendida (sendo que cada hora/aula equivale a cinquenta minutos), devendo ser realizadas 4 (quatro) aulas no período noturno (equivalente a 20%), tendo em vista a inclusão do § 2º ao artigo 158 do CTB, pela Lei nº 12.217/10 (a Resolução do Contran 347/10 prevê, em seu artigo 4º, que o período noturno é aquele compreendido entre o por do sol e nascer do sol, conforme definido no anexo I do CTB, cabendo aos órgãos executivos de trânsito dos estados e do Distrito Federal definir o horário das aulas de prática de direção veicular).
A estrutura curricular é prevista no Anexo II da Resolução do Contran nº 168/04 e abrange os seguintes assuntos:
- O veículo: funcionamento, equipamentos obrigatórios e sistemas;
- Prática na via pública, urbana e rural: direção defensiva, normas de circulação e conduta, parada e estacionamento, observância da sinalização e comunicação;
- Os pedestres, os ciclistas e demais atores do processo de circulação;
- Os cuidados com o condutor motociclista.
Segundo o artigo 158 do CTB, a aprendizagem só pode se realizar nos termos, horários e locais estabelecidos pelo órgão executivo de trânsito e acompanhado o aprendiz por instrutor autorizado, sendo que, além do aprendiz e do instrutor, o veículo utilizado na aprendizagem poderá conduzir apenas mais um acompanhante.
O candidato deve realizar a prática de direção veicular mesmo em condições climáticas adversas tais como: chuva, frio, nevoeiro, noite, dentre outras, que constam do conteúdo programático do curso.
5ª ETAPA: Exame de Prática de Direção Veicular
O Exame de Direção Veicular deve ser realizado pelo órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal e aplicado pelos examinadores titulados no curso previsto em regulamentação específica e devidamente designados.
A realização da prova prática ocorre perante uma comissão formada por três membros, designados pelo dirigente do órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, devendo o candidato estar acompanhado, durante toda a prova, por no mínimo, dois membros da comissão, sendo pelo menos um deles habilitado na categoria igual ou superior à pretendida pelo candidato.
Para veículo de quatro ou mais rodas, o Exame de Direção Veicular deverá ser realizado:
I - em locais e horários estabelecidos pelo órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, em acordo com a autoridade responsável pela via;
II - com veículo da categoria pretendida, com transmissão mecânica e duplo comando de freios (inaplicável apenas para o veículo adaptado para portador de deficiência física, a critério médico);
III – com veículo identificado como “aprendiz em exame” quando não for veículo destinado à formação de condutores.
O Exame de Direção Veicular, para veículo de quatro ou mais rodas, é composto de duas etapas:
I – estacionar em vaga delimitada por balizas removíveis;
II – conduzir o veículo em via pública, urbana ou rural.
A delimitação da vaga balizada para o Exame Prático de Direção Veicular, em veículo de quatro ou mais rodas, deverá atender as seguintes especificações, por tipo de veículo utilizado:
a) Comprimento total do veículo, acrescido de mais 40 (quarenta por cento) %;
b) Largura total do veículo, acrescida de mais 40 (quarenta por cento) %.
Caberá à autoridade de trânsito do órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado e do Distrito Federal definir o tempo máximo para o estacionamento de veículos em espaço delimitado por balizas, para três tentativas, considerando as condições da via e respeitado, no caso da categoria “B”, o intervalo de dois a cinco minutos.
O candidato será avaliado, no Exame de Direção Veicular, em função da pontuação negativa por faltas cometidas durante todas as etapas do exame, atribuindo-se a seguinte pontuação:
I – uma falta eliminatória: reprovação;
II – uma falta grave: 03 (três) pontos negativos;
III – uma falta média: 02 (dois) pontos negativos;
IV – uma falta leve: 01 (um) ponto negativo.
Será considerado reprovado na prova prática de direção veicular o candidato que cometer falta eliminatória ou cuja soma dos pontos negativos ultrapasse a 3 (três).
As faltas do Exame de Direção Veicular, para obtenção da CNH, na categoria “B”, estão previstas no artigo 19 da Resolução do Contran nº 168/04, na seguinte conformidade:
I – Faltas Eliminatórias:
a) desobedecer à sinalização semafórica e de parada obrigatória;
b) avançar sobre o meio fio;
c) não colocar o veículo na área balizada, em no máximo três tentativas, no tempo estabelecido;
d) avançar sobre o balizamento demarcado quando do estacionamento do veículo na vaga;
e) transitar em contramão de direção;
f) não completar a realização de todas as etapas do exame;
g) avançar a via preferencial;
h) provocar acidente durante a realização do exame;
i) exceder a velocidade regulamentada para a via;
j) cometer qualquer outra infração de trânsito de natureza gravíssima.
II – Faltas Graves:
a) desobedecer a sinalização da via, ou ao agente da autoridade de trânsito;
b) não observar as regras de ultrapassagem ou de mudança de direção;
c) não dar preferência de passagem ao pedestre que estiver atravessando a via transversal para onde se dirige o veículo, ou ainda quando o pedestre não haja concluído a travessia, mesmo que ocorra sinal verde para o veículo ;
d) manter a porta do veículo aberta ou semi-aberta durante o percurso da prova ou parte dele;
e) não sinalizar com antecedência a manobra pretendida ou sinalizá-la incorretamente;
f) não usar devidamente o cinto de segurança;
g) perder o controle da direção do veículo em movimento;
h) cometer qualquer outra infração de trânsito de natureza grave.
III – Faltas Médias:
a) executar o percurso da prova, no todo ou parte dele, sem estar o freio de mão inteiramente livre;
b) trafegar em velocidade inadequada para as condições adversas do local, da circulação, do veículo e do clima;
c) interromper o funcionamento do motor, sem justa razão, após o início da prova;
d) fazer conversão incorretamente;
e) usar buzina sem necessidade ou em local proibido;
f) desengrenar o veículo nos declives;
g) colocar o veículo em movimento, sem observar as cautelas necessárias;
h) usar o pedal da embreagem, antes de usar o pedal de freio nas frenagens;
i) entrar nas curvas com a engrenagem de tração do veículo em ponto neutro;
j) engrenar ou utilizar as marchas de maneira incorreta, durante o percurso;
k) cometer qualquer outra infração de trânsito de natureza média.
IV – Faltas Leves:
a) provocar movimentos irregulares no veículo, sem motivo justificado;
b) ajustar incorretamente o banco de veículo destinado ao condutor;
c) não ajustar devidamente os espelhos retrovisores;
d) apoiar o pé no pedal da embreagem com o veículo engrenado e em movimento;
e) utilizar ou Interpretar incorretamente os instrumentos do painel do veículo;
f) dar partida ao veículo com a engrenagem de tração ligada;
g) tentar movimentar o veículo com a engrenagem de tração em ponto neutro;
h) cometer qualquer outra infração de natureza leve.
No caso de reprovação no Exame de Direção Veicular, o candidato só poderá repetir o exame depois de decorridos 15 (quinze) dias da divulgação do resultado, sendo dispensado do Exame Teórico-técnico (pois pressupõe já ter sido aprovado, uma vez que constitui etapa anterior).
Ao final de todas estas etapas, e sendo o candidato aprovado no Exame de Prática de Direção Veicular, é prevista a concessão de um documento de habilitação provisório, válido por um ano, denominado Permissão para Dirigir, o qual será substituído pela Carteira Nacional de Habilitação definitiva, ao final do período, apenas se o condutor não tiver cometido nenhuma infração grave ou gravíssima, nem seja reincidente em infrações médias; caso contrário, deverá o interessado reiniciar todo o processo de habilitação (artigo 148, §§ 3º e 4º, do CTB).
São Paulo, 10 de julho de 2013.
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, MESTRE em Direito do Estado pela PUC/SP e ESPECIALISTA em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; CAPITÃO da Polícia Militar de SP, atual Chefe do Gabinete de Treinamento do Comando de Policiamento de Trânsito; Coordenador e Professor dos Cursos de Pós-graduação do CEAT (www.ceatt.com.br); Conselheiro do CETRAN/SP, desde 2003 e representante dos CETRANS da região sudeste no Fórum Consultivo por dois mandatos consecutivos; Diretor do Conselho Consultivo da ABRAM e Presidente da Associação Brasileira de Profissionais do Trânsito – ABPTRAN (www.abptran.org); Conselheiro fiscal da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET/SP, representante eleito pelos funcionários, no biênio 2009/2011; Autor de livros e artigos sobre trânsito, além do blog www.transitoumaimagem100palavras.blogspot.com.