Comentário
O artigo 160 comporta um procedimento a ser adotado, pelo órgão ou entidade executivo de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, ao condutor que é condenado por delito de trânsito (não havendo menção a qual dos 11 crimes de trânsito, do Capítulo XIX, pode ser imposta tal obrigação), ou àquele que se envolve em um “acidente grave”: não se trata, propriamente, de uma penalidade, já que não está descrita no artigo 256 (embora a natureza seja praticamente a mesma), mas da exigência de submissão a novos exames para que possa voltar a dirigir, no primeiro caso vinculada a uma decisão judicial e, no segundo, dependente de processo administrativo que assegure, ao atingido pela medida, amplo direito de defesa e contraditório (garantias constitucionais constantes do artigo 5º, inciso LV, da CF/88).
A regulamentação do processo administrativo para cumprimento do artigo 160 encontra-se na Resolução do Conselho Nacional de Trânsito n. 300/08, que determina, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, a realização dos seguintes exames: I – de aptidão física e mental; II – avaliação psicológica; III – escrito, sobre legislação de trânsito; e IV – de direção veicular, realizado na via pública, em veículo da categoria para a qual estiver habilitado.
No caso do envolvimento em “acidente grave”, prescreve a necessidade de instauração do respectivo processo, com expedição de notificação ao condutor, abertura de defesa e demais formalidades legais; todavia, infelizmente, não houve, por parte do Conselho Nacional de Trânsito, a definição do que vem a ser “acidente grave”, ficando a critério subjetivo da autoridade de trânsito, que deverá deliberar sobre a conveniência e oportunidade de imposição desta exigência (ressalta-se que o termo “acidente grave” também é previsto no inciso III do artigo 268, como sendo determinante para a submissão do infrator ao curso de reciclagem obrigatório).
Cabe considerar que as consequências jurídicas em decorrência da “condenação por delito de trânsito” são tratadas pelo CTB de formas contraditórias e em dispositivos diferentes, o que gera dificuldade de compreensão quanto à intenção do legislador e, principalmente, qual deve ser o encaminhamento dado aos casos práticos, pois, além do artigo 160, que determina a submissão a novos exames, temos as seguintes previsões legais:
- o artigo 263, inciso II, determina a cassação do documento de habilitação daquele que é condenado judicialmente por delito de trânsito (assim sendo, somente poderia se reabilitar decorridos dois anos da cassação, nos termos do § 2º, não sendo, destarte, possível apenas a submissão a novos exames);
- os artigos 292 e 293 tratam da pena, de natureza criminal, de suspensão do direito de dirigir (ou proibição de se obter a habilitação), pelo prazo de dois meses a cinco anos, a ser aplicada de forma isolada ou cumulativa com outras sanções penais (os crimes dos artigos 302, 303, 306, 307 e 308 trazem, expressamente, tal punição);
- o artigo 268, inciso IV, contempla a submissão ao curso de reciclagem do condutor condenado judicialmente por delito de trânsito.
Nesta confusão legislativa, não há resposta efetiva para a seguinte questão: “Quem é condenado por crime de trânsito deve ficar suspenso do direito de dirigir, de 2 meses a 5 anos; ter o seu documento de habilitação cassado; participar de um curso de reciclagem ou ser submetido a novos exames para voltar a dirigir?”.
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, Capitão da Polícia Militar de São Paulo, com atuação no policiamento de trânsito urbano desde 1996; Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pelo Centro de Altos Estudos de Segurança da PMESP; Mestre em Direito do Estado pela Pontifícia Universidade Católica - PUC/SP; Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Coordenador de Cursos, Professor, Palestrante e Autor de livros e artigos sobre trânsito.
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