Comentário
O artigo 244 prevê infrações de trânsito específicas para três tipos de veículos: motocicleta (veículo automotor de duas rodas, com ou sem side-car, dirigido por condutor em posição montada), motoneta (veículo automotor de duas rodas, dirigido por condutor em posição sentada) e ciclomotor (veículo de duas ou três rodas, provido de um motor de combustão interna, cuja cilindrada não exceda a cinquenta centímetros cúbicos [3,05 polegadas cúbicas] e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a cinquenta quilômetros por hora). Os atuais dez incisos deste dispositivo abrangem as seguintes condutas infracionais:
Inciso I (1ª parte) – não utilização, pelo condutor, de capacete de segurança com viseira ou óculos de proteção: as especificações sobre capacete de segurança, viseira e óculos de proteção estão regulamentadas pela Resolução do Contran n. 940/22.
Em suma, o capacete deve ser de modelo certificado pelo INMETRO, proteger toda a calota craniana (o que exclui capacetes estilo “coquinho”, que cobrem apenas a parte superior da cabeça), possuir cinta jugular e não ter avarias ou danos.
A viseira deve ser do tipo transparente (sendo permitida a escura apenas para uso diurno) e, na sua ausência, o condutor deve utilizar óculos de proteção próprios para o motociclismo (não sendo possível substituí-los por óculos de grau, de proteção solar ou aqueles utilizados como equipamento de proteção individual), sendo que a ausência caracteriza infração específica do inciso X do mesmo artigo.
Apesar de o caput do artigo 244 referir-se apenas a motocicletas, motonetas e ciclomotores, o Conselho Nacional de Trânsito determina que o capacete de segurança também seja utilizado por condutores e passageiros de triciclos e quadriciclos motorizados (artigo 2º da Resolução n. 940/22).
Importante mencionar que, de acordo com o Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, algumas situações NÃO DEVEM ser enquadradas no inciso I do artigo 244 e SIM NO ARTIGO 169 (“Dirigir sem atenção ou sem os cuidados indispensáveis à segurança”): capacete sem estar devidamente fixado à cabeça pelo conjunto formado pela cinta jugular e engate, por debaixo do maxilar inferior; sem que a queixeira esteja abaixada ou travada; e capacete de tamanho inadequado.
A Lei n. 14.071/20 incluiu, neste inciso, a medida administrativa de “retenção do veículo até regularização”, o que passou a respaldar a exigência para que os condutores de motocicletas, motonetas ou ciclomotores sem capacete só sejam liberados no local da fiscalização após providenciá-lo.
Inciso I (2ª parte) – não utilização de vestuário de acordo com as normas e especificações aprovadas pelo Contran: embora o Código de Trânsito esteja em vigor desde 1998, o Conselho Nacional de Trânsito ainda não regulamentou qual deve ser o vestuário adequado para os condutores de motocicletas, motonetas e ciclomotores. A única exceção é o colete de segurança, com dispositivos retrorrefletivos, obrigatório para o condutor de veículo destinado ao transporte remunerado de cargas ou de pessoas (artigo 6º, inciso IV, da Resolução do CONTRAN n. 943/22);
Inciso II (1ª parte) – transporte de passageiro sem capacete: o capacete utilizado pelo passageiro deve seguir às mesmas especificações exigidas para o condutor, constantes da Resolução Contran n. 940/22, inclusive no que se refere à viseira transparente ou óculos de proteção (a ausência caracteriza infração específica do inciso XI);
Inciso II (2ª parte) – transporte de passageiro fora do assento suplementar atrás do condutor ou em carro lateral: não há qualquer regulamentação sobre a forma como o passageiro deve sentar nos veículos de duas rodas, sendo permitido, portanto, o transporte de passageiro sentado de lado. O inciso II do artigo 244 apenas exige que seja utilizado o assento suplementar atrás do condutor ou carro lateral (sidecar) próprio para o transporte de pessoas; assim, é considerada infração de trânsito o transporte de alguém sentado no tanque da motocicleta, por exemplo;
Inciso III – realização de malabarismo ou equilíbrio em apenas uma roda: o inciso III do artigo 244 prevê uma infração de trânsito mais específica que a conduta genérica descrita no artigo 175 (“demonstração ou exibição de manobra perigosa”). Além de punir o motociclista que empina o veículo, o dispositivo legal abrange qualquer forma de malabarismo, como ficar em pé ou deitado sobre a moto;
Inciso V – transporte de menor de dez anos ou sem condições de segurança: com a alteração da Lei n. 14.071/20, a idade mínima para crianças serem transportadas em veículos de duas rodas passou de sete para dez anos; acima desta idade, o que se exige é que a criança tenha condições de cuidar de sua própria segurança, sendo infração de trânsito, por exemplo, o transporte de criança enferma, com os pés ou braços engessados, ou de compleição física que dificulta o posicionamento seguro no veículo. Ressalta-se que “criança”, para efeitos legais, é a pessoa com até doze anos incompletos (artigo 2º da Lei n. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente).
Inciso VI – reboque de outro veículo: o inciso VI do artigo 244 contempla infração mais específica, para este tipo de veículo, em relação à conduta geral prevista no artigo 236 (“rebocar outro veículo com cabo flexível ou corda”). O § 3º foi acrescentado ao artigo 244, pela Lei n. 10.517/02, para permitir, excepcionalmente, o tracionamento de semirreboques especialmente projetados para motocicletas e motonetas;
Inciso VII – sem segurar o guidom com ambas as mãos: a única situação em que o condutor pode retirar as mãos do guidom é com o intuito de realizar indicação de manobras, para informar, aos demais usuários da via, a intenção de conversão à esquerda ou direita ou, ainda, a diminuição da velocidade;
Inciso VIII (1ª parte) – transporte de carga incompatível: o transporte de cargas é regulamentado pelos artigos 9º a 15 da Resolução do Contran n. 943/22, que estabelecem as dimensões máximas da carga e dos dispositivos para transporte (apesar de esta Resolução versar sobre o transporte remunerado, o artigo 15 determina a aplicação das mesmas disposições ao transporte não remunerado);
Inciso VIII (2ª parte) – transporte de combustíveis, produtos inflamáveis, tóxicos e galões: a segunda parte do inciso VIII do artigo 244 foi incluído pela Lei n. 12.009/09 e faz referência ao § 2º do artigo 139-A, que proíbe o transporte de combustíveis, produtos inflamáveis ou tóxicos e de galões nestes veículos, com exceção do gás de cozinha e de galões contendo água mineral, desde que com o auxílio de side-car, nos termos da regulamentação do Contran;
Inciso IX (1ª parte) – motofrete irregular: a primeira parte do inciso IX do artigo 244 pune o transporte remunerado de cargas que não atenda às normas próprias para a prestação deste serviço. O artigo 139-A exige, resumidamente: registro da categoria de aluguel; protetor de motor e pernas; aparador de linha antena corta-pipas e inspeção semestral (regras que estão complementadas pela Resolução do Contran n. 943/22);
Inciso IX (2ª parte) – mototáxi irregular: a segunda parte do inciso IX do artigo 244 pune o transporte remunerado de passageiros que não atenda às normas constantes da Lei n. 12.009/09 e Resolução do Contran n. 943/22.
Inciso X – falta de viseira / óculos no capacete do condutor: até a entrada em vigor da Lei 14.071/20, a falta de viseira ou óculos de proteção ou, ainda, que estivessem em desacordo com a regulamentação do CONTRAN eram condutas que, de acordo com o Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, caracterizavam a infração prevista no artigo 169 (“Dirigir sem atenção ou sem os cuidados indispensáveis à segurança”).
Atualmente, caracterizam a infração prevista no artigo 244, X (no caso do condutor) ou XI (para o passageiro). As condutas mais comuns que se enquadram neste dispositivo são:
- sem viseira ou óculos de proteção;
- viseira ou óculos de proteção sem boas condições de uso;
- viseira ou óculos de proteção em posição que não dê proteção total aos olhos;
- viseira ou óculos de proteção com película;
- viseira em padrão diverso do cristal, no período noturno; e
- óculos de sol, óculos corretivos ou de segurança do trabalho (EPI), em substituição ao óculos de proteção.
Inciso XI – falta de viseira / óculos no capacete do passageiro: aplicam-se as mesmas considerações acima, mudando-se apenas o inciso respectivo.
Finalmente, cabe destacar um equívoco de alteração legislativa, decorrente da Lei n. 12.009/09: os incisos VI a IX passaram a ter a medida administrativa de “apreensão do veículo para regularização”, porém NÃO existe esta medida administrativa, tendo sido feita uma junção da penalidade (já revogada) de “apreensão do veículo” e a medida administrativa de “retenção do veículo” (esta sim, destinada à regularização da falha detectada). Para suprir este erro redacional, o Conselho Nacional de Trânsito estabeleceu, no Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito (Resolução n. 925/22), que deve ser aplicada, nestes casos, a medida administrativa de RETENÇÃO do veículo para regularização.
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, Consultor e Professor de Legislação de trânsito, com experiência profissional na área de policiamento de trânsito urbano de 1996 a 2019, atualmente Major da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo; Conselheiro do CETRAN/SP desde 2003; Membro da Câmara Temática de Esforço Legal do Conselho Nacional de Trânsito (2019/2021); Mestre em Direito do Estado, pela Pontifícia Universidade Católica - PUC/SP, e em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, pelo Centro de Altos Estudos de Segurança da PMESP; Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Coordenador de Cursos, Palestrante e Autor de livros e artigos sobre trânsito.
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Art. 244
Capítulo XV - DAS INFRAÇÕES
Conduzir motocicleta, motoneta e ciclomotor:
VI - rebocando outro veículo;
VII - sem segurar o guidom com ambas as mãos, salvo eventualmente para indicação de manobras;
VIII - transportando carga incompatível com suas especificações ou em desacordo com o previsto no § 2º do art. 139-A desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 12.009, de 2009)
IX - efetuando transporte remunerado de mercadorias em desacordo com o previsto no art. 139-A desta Lei ou com as normas que regem a atividade profissional dos mototaxistas: (Incluído pela Lei nº 12.009, de 2009)
Infração – grave; (Incluído pela Lei nº 12.009, de 2009)
Penalidade – multa; (Incluído pela Lei nº 12.009, de 2009)
Medida administrativa – apreensão do veículo para regularização. (Incluído pela Lei nº 12.009, de 2009)
X - Conduzir motocicleta, motoneta ou ciclomotor com a utilização de capacete de segurança sem viseira ou óculos de proteção ou com viseira ou óculos de proteção em desacordo com a regulamentação do Contran;
XII - (VETADO).
§ 1º Para ciclos aplica-se o disposto nos incisos III, VII e VIII, além de:
a) conduzir passageiro fora da garupa ou do assento especial a ele destinado;
b) transitar em vias de trânsito rápido ou rodovias, salvo onde houver acostamento ou faixas de rolamento próprias;
c) transportar crianças que não tenham, nas circunstâncias, condições de cuidar de sua própria segurança.
§ 2º Aplica-se aos ciclomotores o disposto na alínea b do parágrafo anterior:
Infração - média;
§ 3º A restrição imposta pelo inciso VI do caput deste artigo não se aplica às motocicletas e motonetas que tracionem semi-reboques especialmente projetados para esse fim e devidamente homologados pelo órgão competente.(Incluído pela Lei nº 10.517, de 2002)
Penalidade - multa.