Comentário
Artigo 29
Dentre os artigos que compõem o Capítulo III do CTB, que versa sobre as normas gerais de circulação e conduta, o artigo 29 é o mais abrangente, trazendo várias regras para os usuários da via, as quais podem ser assim resumidas (e complementadas):
1) mão de direção: em regra, a circulação deve ser feita pela direita da via, exceto se houver placa de regulamentação indicando o contrário; o trânsito na contramão de direção é punido pela infração de trânsito prevista no artigo 186;
2) distância de segurança: o condutor deve guardar distância de segurança lateral e frontal, sob pena do cometimento da infração do artigo 192, não havendo, entretanto, uma determinação exata de qual deve ser a distância a ser guardada, a não ser quando o condutor estiver passando ou ultrapassando um ciclista, pois, neste caso, a infração do artigo 201 estabelece a distância de um metro e cinquenta centímetros;
3) preferência em cruzamentos: em cruzamentos não sinalizados, existem 3 regrinhas de preferência: 1º) rodovia; 2º) rotatória; 3º) mão direita. Interessante verificar dois aspectos nesta norma: o primeiro é que as preferências mencionadas só são válidas nos cruzamentos sem sinalização, nada impedindo que o órgão de trânsito, se assim entender melhor, coloque, por exemplo, uma placa de “dê a preferência” ao condutor que circula em rotatória; o segundo aspecto é que muitas outras preferências não são decorrentes da lei, mas apenas de costume, como uma via mais larga, com faixa de ônibus, sem redutores de velocidade, em aclive etc;
4) destinação das faixas de rolamento: quando a pista de rolamento tiver mais de uma faixa, o Código determina a divisão de acordo com a sua utilidade: as faixas da direita são destinadas aos veículos mais lentos e de maior porte (desde que não haja nenhuma faixa especial a eles destinada), enquanto que as da esquerda são destinadas à ultrapassagem e ao deslocamento dos veículos de maior velocidade (portanto, ao contrário do que muitos pensam, a faixa da esquerda não é apenas para ultrapassagem);
5) acesso a imóveis ou áreas de estacionamento: como exceção, o artigo 29, inciso V, autoriza que se transite sobre passeios, calçadas e nos acostamentos (não incorrendo, neste caso, na infração do artigo 193), quando o condutor tiver a intenção de entrar ou sair de imóveis ou áreas especiais de estacionamento;
6) veículos escoltados: os veículos precedidos de batedores são aqueles devidamente escoltados, os quais têm prioridade de passagem, respeitadas as demais normas de circulação – isto significa que tais veículos não estão liberados das regras viárias, devendo obedecer, entre outras normas, à sinalização de trânsito e ao limite de velocidade; sua única prerrogativa é a prioridade de passagem, ou seja, os outros veículos devem aguardar a sua passagem, para prosseguir na marcha;
7) prerrogativas dos veículos de emergência: são seis os veículos de emergência: de socorro de incêndio e salvamento, de salvamento difuso, de polícia, de fiscalização e operação de trânsito e ambulâncias, por força da Resolução do CONTRAN n. 970/22; e de transporte de presos, por força da Resolução do CONTRAN n. 626/16, identificados pelo dispositivo luminoso (chamado “giroflex”), na cor vermelha, azul, ou combinação de ambas, e alarme sonoro (sirene). Tais veículos, quando em serviço de urgência (“entende-se por prestação de serviço de urgência os deslocamentos realizados pelos veículos de emergência, em circunstâncias que necessitem de brevidade para o atendimento, sem a qual haverá risco concreto à vida de terceiros ou grande prejuízo à incolumidade pública.” - artigo 5º, § 4º, da Resolução do CONTRAN n. 970/22), de policiamento ostensivo ou de preservação da ordem pública, além da prioridade de passagem, gozam de livre circulação, estacionamento e parada, o que significa que podem transitar livremente em qualquer condição ou local que a regra seja a proibição; por exemplo, podem avançar o sinal vermelho do semáforo, exceder o limite de velocidade ou estacionarem sobre o passeio. Para a livre circulação e parada, esses veículos devem acionar os “dispositivos regulamentares de alarme sonoro e iluminação intermitente”; sendo que, para o livre estacionamento, basta o acionamento dos “dispositivos regulamentares de iluminação intermitente”; O § 4º ainda prevê que, em situações especiais, ato do Ministro da Justiça e Segurança Pública poderá dispor sobre a aplicabilidade das prerrogativas acima aos veículos oficiais descaracterizados.
Ressalta-se que, de acordo com o novo Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito (Resolução do CONTRAN n. 985/22), “não deverão ser processadas as imagens registradas por equipamentos medidores de velocidade do tipo fixo ou por sistemas automáticos não metrológicos, nas condutas de circulação, estacionamento e parada para os veículos elencados no inciso VII do artigo 29 do CTB, desde que estejam devidamente caracterizados externamente por pintura ou plotagem, que identifique o veículo de relance, na forma definida pelo próprio órgão.”
Apesar destas regras gerais, as prerrogativas dos veículos de emergência passaram a ser ainda mais amplas, a partir de 20JUN23, com a Lei n. 14.599/23, que incluiu o § 6º ao artigo 280, para estabelecer que NÃO HÁ INFRAÇÃO de circulação, parada ou estacionamento relativa aos veículos de emergência, ainda que não identificados ostensivamente, ou seja, não haverá nem mesmo a necessidade de acionamento dos dispositivos (sonoro e luminoso), tampouco a comprovação de serviço de urgência, de policiamento ostensivo ou de preservação da ordem pública, como prevê o inciso VII do artigo 29, para garantir as prerrogativas.
Agora, NÃO HÁ NENHUMA INFRAÇÃO cometida por estes veículos, quando relacionada à circulação, parada ou estacionamento; todavia, entendemos que a infração deve ter relação com a prestação específica do serviço, não alcançando, por exemplo, infrações como falta de licenciamento, uso do telefone celular ou não utilização do cinto de segurança.
8) prerrogativas dos veículos de utilidade pública: os veículos prestadores de serviços de utilidade pública não possuem prioridade de passagem, nem livre circulação, mas apenas livre parada e estacionamento no local da prestação de serviço, desde que devidamente sinalizados, com o dispositivo luminoso na cor amarelo âmbar, conforme Resolução do CONTRAN n. 970/22 (cujo artigo 6º, § 1º, estabelece quais são os veículos de utilidade pública);
9) normas para ultrapassagem: em regra, a ultrapassagem deve ser feita pela esquerda, sendo obrigatório que o condutor siga os seguintes passos: I) certificar-se de que não há condutor ultrapassando o seu próprio veículo; II) verificar se o condutor a ser ultrapassado não iniciou a mesma manobra de um terceiro; III) avaliar se há distância suficiente para a ultrapassagem; IV) indicar, com antecedência, mediante luz (seta) ou gesto de braço; V) manter distância lateral de segurança; V) acionar novamente a luz (seta) ou fazer gesto de braço, retomando à faixa de origem;
10) preferência de passagem para veículos sobre trilhos: a inobservância do direito de preferência de passagem aos veículos que se deslocam sobre trilhos, além de acarretar um risco de graves danos, configura infração de trânsito do artigo 212;
11) regras para a transposição de faixas: o § 1º do artigo 29 autoriza a transposição de faixas tanto pela esquerda quanto pela direita (segundo o Anexo I do CTB, transposição de faixas é a “passagem de um veículo de uma faixa demarcada para outra”; desta forma, a saída de trás de um veículo, com o retorno à faixa de origem, é que caracterizará a ultrapassagem);
12) responsabilidades no trânsito: embora não seja regra de preferência, prevê o § 2º do artigo 29 uma ordem de responsabilidade no trânsito: I) os veículos de maior porte responsáveis pelos menores; II) os motorizados pelos não motorizados; III) todos, pelos pedestres.
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, Consultor e Professor de Legislação de trânsito, com experiência profissional na área de policiamento de trânsito urbano desde 1996; Major da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo; Conselheiro do CETRAN/SP desde 2003; Membro da Câmara Temática de Esforço Legal do Conselho Nacional de Trânsito desde 2019; Mestre em Direito do Estado, pela Pontifícia Universidade Católica - PUC/SP, e em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, pelo Centro de Altos Estudos de Segurança da PMESP; Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Coordenador de Cursos, Palestrante e Autor de livros e artigos sobre trânsito.
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